Por Lays Tavares e Nathália Wicks
Em um dos desfiles que entrou para a história do São
Paulo Fashion Week, o brasileiro filho de japoneses Jum Nakao colocou na
passarela um "não desfile" repleto de ativismo político cultural. Era
julho de 2004 e a moda, assim como hoje, passava por momentos de
questionamentos quanto a sua função e conteúdo. Assuntos como efemeridade,
consumo excessivo e preocupações com a frivolidade superficial da indústria
têxtil motivaram o estilista a propor uma reflexão acerca do futuro do sistema
que engloba o mercado.
"A costura do invisível" apresenta uma
coleção toda feita de papel, em formas suntuosas e trabalhadas detalhadamente -
volumes, texturas que remetem à rendas e brocados, e inclusões de modelos da
era vitoriana. O trabalho ali era belo, mágico, delicado, resultado da mais
fina e tecnológica mão de obra que a indústria têxtil poderia realizar para
aquela época. Mas essa não era a mensagem que o designer queria passar. Não
eram aquelas peças que iam estar nas araras na próxima temporada. Aquela beleza
era perecível e durou apenas alguns minutos, como referência à própria moda,
com seu caráter mutável e transitório, sendo descartada a cada estação. A
referência que o criador utilizou para ilustrar esse descarte foi literalmente
rasgar a sua obra, acabar com seu próprio trabalho, no momento em que as
modelos destruiram furiosamente as produções resultadas de 700 horas de
trabalho minuscioso.
Que moda é essa, que se desenvolve tecnologicamente e
se atrofia nas ideias? Este é um questionamento que se perpetuou no cenário
brasileiro após o desfile, e pertinentemente, ainda é assunto/pauta para muitas
discussões. Isso prova que por mais descartáveis que fossem as peças
desfiladas, a intenção era tão pertinente, que a mensagem ficou. A coleção
virou um livro, rendeu assunto para palestras e exposições realizadas no Brasil
e no exterior sobre o processo criativo de desenvolvimento da coleção, e fez
nascer um novo Nakao, dedicado a formação e ao pensar da moda, não mais na
produção efêmera. Este foi o último desfile de Jum Nakao. A moda perdeu um
designer, mas ganhou um pensador.
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